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| Instalação Têxtil “Sol Diário”, por Flávia Vanelli |
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| Exposição Novo Olhar – Libertas |
A primeira edição do Paraty Eco Fashion que aconteceu entre os dias 5 e 7 de agosto, no interior do Rio de Janeiro, foi coroado de sucesso por todos aqueles que, durante três dias de evento interagiram entre si e com as comunidades locais.
Quem narra abaixo os detalhes destes dias de pura sinergia é a estilista Juliana Foz da marca Lírio Lê.
“Acabo de chegar do 1º Paraty Eco Fashion, cheia de informações, experiências e inúmeras idéias fervilhando na cabeça. E gostaria de compartilhar com vocês meu olhar sobre tudo o que aconteceu neste evento com foco no desenvolvimento sustentável, emoldurado pela encantadora paisagem da cidade. Nestes três dias aconteceram desfiles de moda, exposições, workshops, conferências, onde se viam estilistas, designers, artesãos, jornalistas, especialistas em sustentabilidade e estudantes de moda trocando conhecimento e experiências.
Roberto Meireles do Instituto Rio Moda deu início ao evento na tarde de sexta-feira com uma palestra baseada no livro “Doze dragões em luta com as iniciativas sociais”, de Lex Bos. A palestra explanou sobre como tirar partido dos problemas, para que as boas iniciativas não sumam mais rápido do que aparecem. Onde os “dragões” do Dirigismo, Absolutismo, Pressa, Conformismo, etc devem se tornar inspirações para que o projeto se concretize, mantendo sempre o equilíbrio e a força de vontade.
Durante a abertura oficial do evento na Pousada Caminho do Ouro, um coquetel todo feito a partir da gastronomia sustentável foi servido aos convidados. As idealizadoras do evento Bernadete Passos e Carminha Santos contaram: “O Paraty Eco Fashion vem tomando forma há quase dois anos. Primeiro foram longas conversas sobre o sonho de realizar um evento sobre moda; depois, o diferencial da sustentabilidade pela via da educação; na sequência, o arregaçar as mangas: pesquisa para valer e muito trabalho, com a constatação de que estava na hora de fazer o sonho acontecer.”
Assim, em março de 2011 alunos de moda de todo país se inscreveram para participar do projeto. Um ponto imprescindível foi a inclusão das comunidades tradicionais, onde cada equipe escolheu o seu foco de estudo trabalhando e promovendo interação com comunidades, troca de conhecimentos voltada para o artesanato de cada região e pesquisas de materiais sustentáveis viáveis para produção de moda. Além de artesãos de todo país, comunidades de Paraty estiveram envolvidas no projeto: a comunidade caiçara, com seus bordados; a comunidade indígena guarani, com seus trançados; e a quilombola, com seu colorido e suas cestarias.
Participam do evento 18 equipes de cinco Estados brasileiros, todas de excelente qualidade e afinadas em suas propostas de uma produção inovadora. São elas: Alecrim; Ana Carolina da Mata Araújo; Anjo da Moda; Grife Criolê; Oficina Callicore; UFRJmar Paraty; Impacto!; Libertas; Lírio Lê; Michelle Ramos Victório; Nêga; Produtos em Rede;Ecomoda Udesc;Equipe Reciclada; Rumaos Atelier; Trama Feminina; Tramas Sustentáveis e Mulheres de Fibra.
Durante a noite tivemos a abertura da Exposição “Novo Olhar”, com os trabalhos desenvolvidos pelas equipes propondo uma moda eco friendly e sustentável, provando o quanto essa chamada economia criativa é capaz de produzir com capricho, beleza e qualidade.
Os participantes do evento foram presenteados com a linda apresentação do Coral Indígena Paraty – Mirim Itaxi, na qual os pequeninos índios fizerem uma oração em forma de cântico, emocionando a todos.
Zuzu Angel, uma das grandes homenageadas do evento foi lembrada na noite por Celina de Farias (vice-presidente do Instituto Zuzu Angel (http://www.zuzuangel.com.br/) e apresentou o filme “Zuzu Angel – Eu sou a moda brasileira”. Quem também subiu ao palco foi Nina Braga, do Instituto-e (http://www.institutoe.org.br/), com seu documentário “Bocaína: Caminhos do Alto”. Programação vibrante e intensa, encerrada com o show do cantor Luis Perequê.
Uma das principais propostas do Paraty Eco Fashion foi a integração entre estudantes de design e comunidades tradicionais. O trabalho originado por este intercâmbio foi apresentado no sábado de manhã na passarela do evento, que também questionou a ditadura de beleza da moda atual: todos os modelos eram jovens de Paraty que desfilaram de forma voluntária. Corpos normais vestindo uma proposta que tende a se tornar cada vez mais “normal” também…
A primeira equipe a se apresentar, a Lírio Lê, levou a preocupação com os resíduos têxteis. Parte do meu trabalho de conclusão de curso, o projeto desenvolveu roupas a partir de retalhos e acessórios em parceria com a artesã Josefa Donadon da Reforma Agrária do assentamento Reunidas, localizado em Promissão, interior de São Paulo. Essa coleção, apresentada no evento, foi desenvolvida e comercializada a convite do Espaço Moda do Futuro.
O estudante Valdecir Santos, único integrante da equipe Anjo da Moda, mostrou o uso de resíduos de jeans para a produção de bolsas. A Criolê faz parte de um ponto de cultura em Hortolândia, São Paulo, que resgata e preserva as raízes da comunidade negra. O trabalho, inspirado no candomblé com técnicas de tie-die e amarrações, foi desenvolvido em parceria com comunidades de rendeiras de Fortaleza e produtores de algodão orgânico de Minas Gerais.
A Tamanduá sem bandeira trabalhou com faixas e banners de rua usados para anúncios. A proposta era utilizar os resíduos ao máximo, e com isso (acreditem!), a equipe gastou apenas dez reais para produzir vestidos, camisetas e calças.
Eco-moda é uma equipe que trabalha há sete anos com moda sustentável no curso de extensão da UDESC/UFSC. Ela interagiu com a Associação de Rendeiras de Bilro de Florianópolis para utilizar a técnica da renda com fios orgânicos e reciclados. A Universidade oferece à comunidade capacitações para desenvolver o bordado, a modelagem e a costura. Já a Alecrim mostrou como criar uma roupa a partir de tapetes de banheiro descartados e camisetas de malha de garrafa pet. Para completar o look, a estudante de moda Amanda Mol criou lindos acessórios feitos de rolhas, filmes fotográficos e folhas desidratadas.
As integrantes da Libertas interagiram com as artesãs da Praia do Sono, em Trindade, Rio de Janeiro. Elas buscaram empresas que tivessem uma cadeia produtiva não agressiva ao meio ambiente e utilizaram retalhos e técnicas ambientalmente corretas de estamparia.
A proposta da Nêga foi conhecer a cultura caiçara de Paraty através de visitas à regiões como Pouso da Cajaíba, Ponta Negra e Ilha do Araújo. Elas buscaram resgatar a cultura com o uso de materiais como couro de peixe, palha, tecidos orgânicos e de fonte reciclada. E, para finalizar, esse “brainstorm ecofashion”, as estudantes da Fazendo Arte no Cerrado utilizaram o reaproveitamento de materiais para criarem novos e coloridos vestidos.
Workshops, oficinas e desfiles de “mestres” da moda sustentável no segundo dia
Durante o sábado a tarde ocorreram simultaneamente: Workshop de Moda Customizada, por Caio Von Vogt; Workshop de Moulage Criativa, por Lena Santana, e exibição do filme Zuzu Angel, de Sérgio Rezende. Optei por escutar um pouco mais sobre a técnica da Moulage com a estilista Lena Santana. Em seu workshop a estilista fez a defesa da roupa atemporal, feita com qualidade, que dura muitas estações, e vai contra a lógica do fast fashion que vem consumindo o mundo. Isso é sustentabilidade! Lena, além da bandeira da consciência ecológica, também mostrou a técnica de moulage, que consiste em construir a roupa no próprio manequim, o que só traz vantagens: A técnica é mais prática que a modelagem plana, e é possível visualizar o caimento da peça no momento que a construimos. Ao final do workshop, cada participante ganhou o livro “Um pedaço de tecido”, em que Lena propõe maneiras práticas de criar e modelar as próprias peças de roupa.
Outro ponto alto no sábado foi a Conferência Moda Eco e Sustentabilidade, com a participação de Nina Braga (Instituto-e); Luiza Marcier (estilista e consultora do Projeto Museu da Moda pela Secretaria de Cultura do Estado do Rio de Janeiro) ; e a professora Lilyan Berlim (faculdades Veiga de Almeida e La Salle) , com mediação de Celina de Farias (vice- presidente do Instituto Zuzu Angel). O principal tema discutido foi a questão da estética do artesanato aliada à moda e a ética na moda. O encontro gerou um debate produtivo a respeito da moda brasileira e também sobre políticas públicas que facilitem e promovam a sustentabilidade.
Durante a noite foram apresentados os desfiles de Caio Von Vogt, criador do primeiro tecido 100% ecológico e orgânico do mundo; e Lena Santana, estilista brasileira que vive em Londres, reconhecida mundialmente por utilizar o reaproveitamento de tecidos. Além dos desfiles, houve apresentações musicais, de dança e uma linda homenagem aos Mestres Cirandeiros de Paraty, que receberam um certificado de reconhecimento da Secretaria de Cultura. As atividades do dia acabaram com a banda Ciranda Elétrica tocando em comemoração ao Dia do Caiçara, onde a população da cidade e os turistas entraram na dança e nos costumes locais.
Palestra de figurinista mostra reutilização dentro da Globo
O último dia do evento começou com a palestra da figurinista Emilia Duncan, que falou a respeito da reciclagem e da responsabilidade social dentro da construção de figurino. Emilia contou que começou a perceber o valor da moda ecológica quando não havia a verba necessária para a criação de seus figurinos. Foi assim com o filme Carlota Joaquina, quando precisou se virar com o que tinha em mãos, deixando que a criatividade a guiasse. Recriou jóias de ouro com papel de jornal, fez colares com bolinhas de gude, etc… E depois da experiência com o filme nunca mais parou de reciclar… Nas minisséries A Muralha, Mad Maria e Amazônia; e na novela Caminho das Índias a figurinista fez o mesmo. Tapete de banheiro virou jaqueta; calota de automóvel, acessório de cabeça e as estampas eram feitas com carimbo de batata. Emilia Duncan encerrou dizendo: “Quanto mais temos acesso a abundância material e seus excessos, mais a vida em si se torna pobre. Perdemos a oportunidade de nos relacionarmos com o sagrado que nos cerca.”
Depois da palestra, o Paraty Eco Fashion seguiu com um debate onde foi possível refletir o por quê de estarmos ali e o que poderá ser feito daqui para a frente. O principal objetivo do evento foi o de provocar debates, gerar a troca de idéias e experiências, além de refletir sobre o papel do profissional da moda e do consumidor nesta nova era consciente. Em seus três dias de realização, comprovou, na prática, com belas peças de vestuário e acessórios, que, sim, é possível! Que essa seja a primeira de muitas edições do Paraty Eco Fashion, pois ainda há muito que se fazer pela moda consciente e sustentável, a Moda do Futuro!
Fonte:Ecofashion Mag

